quinta-feira, 14 de julho de 2011

A tristeza da presidente - Editorial do Estado de SP

A presidente Dilma Rousseff minimizou as suas atribulações ao dizer, numa entrevista, que "tem dias" que fica triste "quando acontece alguma coisa errada" no seu governo. Dado que a política é indissociável da governança, as coisas erradas nessa frente não apenas não são esporádicas, mas de tal forma se empilham que a presidente teria motivos para viver em estado de permanente tristeza. Ela fez a sua relutante confissão na terça-feira. Nesse dia, depondo numa comissão do Senado, o diretor do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), Luiz Antonio Pagot, deu-lhe a alegria de elogiar o seu zelo e de desmentir explicitamente os rumores de que citaria o então ministro do Planejamento (hoje nas Comunicações), Paulo Bernardo, e a senadora sua mulher, Gleisi Hoffmann, atual titular da Casa Civil, numa nebulosa história de doações eleitorais e obras sob medida para os doadores. Mas o resto foi só mágoa.

Não se sabe se Pagot teria base para levantar suspeitas sobre o casal, como não se sabe nem sequer a situação em que ele se encontra e qual será o seu destino - e esses mistérios têm tudo que ver com as entristecedoras coisas erradas que se sucedem no Planalto. Sabe-se apenas que a sua comportada conduta no Senado resultou de uma negociação indireta com a presidente. O intermediário foi o padrinho político do figurão do Dnit, o ex-governador de Mato Grosso e senador Blairo Maggi, também do PR. Apontado pela revista Veja como um dos personagens-chave de um esquema de corrupção armado na pasta dos Transportes, Pagot soube pelo seu ainda chefe, ministro Alfredo Nascimento, que a presidente determinara o seu imediato afastamento (e o dos demais citados). Retrucou que é demissível, mas não afastável, e de mais a mais tinha entrado em férias.

Ciosa de sua autoridade, Dilma mandou avisar que ele seria exonerado assim que voltasse ao trabalho. Eis por que se especulava que ele se vingaria no seu depoimento. Não só não se vingou, como teve o cuidado de ressaltar que todas as decisões relativas a obras, licitações, contratos e os afamados aditivos - o foco provável da corrupção - eram tomadas em colegiados e "corroboradas" pelo secretário executivo da pasta, Paulo Sérgio Passos, o substituto de Nascimento pinçado por Dilma para zanga do PR do deputado mensaleiro Valdemar Costa Neto, secretário-geral da agremiação. Em suma, nem ele, Pagot, nem nenhum dos seus parceiros fizeram qualquer coisa que pudesse ser considerada irregular, para não dizer ilícita, nesse tempo todo.

Desmentindo, assim, a presidente Dilma, o diretor do Dnit foi praticamente beatificado por seus companheiros de legenda, pelos aliados da base parlamentar do governo - incluindo o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza, que aproveitou para se "solidarizar" com o ministro que se demitira -, e pelo novo titular da pasta, para quem Pagot é um "profissional responsável", contra o qual nada pesa. Mais do que depressa, armou-se na base um movimento para Dilma mantê-lo na função. Só faltou dizerem em público que ela precisaria pedir desculpas por ter endossado e reforçado as denúncias de falcatruas no seu governo. Esse é o drama da presidente. A coalizão que em tese deveria apoiá-la não lhe perdoa ter feito a coisa certa, porque feriu os interesses de um dos 14 partidos que a integram - e, nessas circunstâncias, é um por todos e todos por um.

Eles também se unem na expectativa de que ela pague pontualmente o preço que cobram por seu apoio. Nos oito anos passados eles não precisavam lembrar de seus deveres a um presidente obcecado em fazer o sucessor por quaisquer meios. Além de não deixá-los na mão, Lula exacerbou os vícios do sistema político brasileiro. Com o seu "presidencialismo de resultados", entregou o Ministério dos Transportes aos apetites do PR de Costa Neto e congêneres. Em 2002, na sua encarnação anterior como PL, o partido recebeu R$ 10 milhões do PT. O negócio foi fechado na mesma hora do acerto do candidato Lula com o seu vice José Alencar. No fim das contas, as máfias políticas que ele cevou para eleger Dilma são as mesmas que agora a deixam numa tristeza sem remissão à vista.

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