segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O que esperar do mercado de telefonia móvel no Brasil?

Autor(es): Bernardo Macedo e Cláudia Viegas
Correio Braziliense - 03/01/2011

Em outubro, o Brasil chegou a 194,4 milhões de acessos móveis, o que resulta em mais de 100,4 acessos por 100 habitantes. Mas o que o consumidor ganha com isso? Para ele, tão importante quanto o acesso, é o uso efetivo dos serviços de telecomunicações. Nesse quesito, porém, o Brasil está longe de ser destaque. Enquanto o consumo médio mensal no país gira em torno de 91 minutos, na América Latina atinge 117 minutos mensais, e, na Europa e Ásia, 157 e 212 minutos, respectivamente.

O custo elevado do serviço explica o consumo tímido, sendo que os tributos respondem por quase 30% do preço pago pelo consumidor de telefonia móvel no Brasil. Não se pode ignorar, porém, que há outro componente de peso que afeta negativamente o uso do serviço móvel: o VU-M (valor do uso da rede móvel).

É sobre esse componente que a regulação econômica deve atuar. O VU-M, ou mecanismos similares, foi usado em muitos países como forma de consolidar a telefonia móvel. Ao terminar a ligação na rede móvel, a operadora recebe VU-M da concessionária fixa ou operadora móvel que iniciou a chamada. Trata-se de remuneração para o tráfego entrante na rede móvel.

Se essa fonte de receita é importante para as operadoras móveis quando o serviço é incipiente, deve diminuir à medida que o mercado se expande, em favor do usuário do serviço. Porém, diferentemente do que se observa na experiência internacional, o VU-M no Brasil não vem apresentando queda e figura como o segundo maior do mundo.

A convivência entre uma elevada teledensidade e o baixo nível de consumo indica que não é o segmento de baixa renda que se beneficia com o VU-M. Esse consumidor, para se beneficiar das promoções, adquire dois (ou mais) chips móveis. Dado o consumo baixo de cada acesso, as operadoras alegam necessitar de VU-M elevado para compensar os custos.

Mas é justamente o alto VU-M que inibe o consumo. O alto VU-M estimula as operadoras móveis a manter elevada base de assinantes pré-pagos com baixo consumo, que geram receita com tráfego entrante. Mas são os usuários de renda mais elevada, do pós-pago, que são subsidiados com a receita do VU-M, com planos promocionais e aparelhos subsidiados.

Considerando a experiência internacional, a redução do VU-M, além de viabilizar a redução da tarifa de público, deverá impor nova dinâmica competitiva ao mercado. As operadoras precisarão focar os esforços em atrair e manter clientes para que optem por uma única operadora.

A Resolução nº 480/2007 prevê que, já em 2010, o VU-M passaria a ser apurado pelo modelo Fully Allocated Costs, sendo definido pelo RVU-M (valor de referência de uso da rede móvel). Mas, até o momento, a Anatel não instituiu metodologia para esse cálculo. A expectativa é que, com o modelo de RVU-M, o VU-M seja reduzido.

Na Consulta Pública nº 37, a Anatel estabeleceu vinculação entre o VU-M e o valor da tarifa de público em casos de arbitragem, definindo uma regra de transição para o VU-M, enquanto o RVU-M não é estabelecido. Ao incentivar a redução do VU-M, a agência parece visar à criação de regra de transição consistente com o que se quer construir. No entanto, pelo regulamento proposto, a tarifa de público será reduzida nos dois próximos anos, enquanto o VU-M seria reduzido em 85% do valor da queda nominal prevista para aquela tarifa – descompasso que amortece a redução do VU-M.

Quanto antes e quanto mais cair o VU-M, maiores os benefícios ao consumidor, principalmente o de baixa renda. Com menor VU-M, a receita com tráfego entrante se reduzirá, mas continuará expressiva. Todavia, é de esperar que os preços dos serviços passem a refletir de forma mais fiel a elasticidade-preço do consumidor.

Mesmo reconhecendo o mérito da solução intermediária, muitas manifestações à consulta pública salientaram a necessidade de mais estudos por parte da Anatel. O risco é de perder a oportunidade de incentivar quedas mais ambiciosas do VU-M que já poderiam ter ocorrido. Um redutor tímido, como o constante da CP 37, trará pouco incentivo para que as operadoras revelem o real custo das redes. Deve-se incentivar as operadoras a revelarem qual é o RVU-M, que já deveria estar sendo apurado pelo regulador.

Com a proposta da CP 37, perde-se a oportunidade de avançar na solução das distorções citadas – em que os subsídios são destinados ao consumidor de alta renda, cabendo ao de mais baixa renda ter acesso ao serviço apenas para receber chamadas – e de ampliar o uso do serviço, beneficiando o consumidor.

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